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Idoso, eu?

Atualizado: 19 de jan. de 2020

O preconceito com o envelhecimento, no Brasil, é tão enraizado culturalmente, que os próprios idosos negam que compõem este grupo, por entender que se apresentar como "idoso", significa colocar-se como pessoa dependente, doente e problemática.


Toda palestra que dou para um público com maioria de idosos, inicio perguntando: "Quem aqui é idoso?" Vejo algumas mãos levantarem com orgulho e bem decididas. Algumas outras exitam e levantam depois que os donos dessas mãos verificam se os amigos ao lado estenderam os braços ou não. Ao mesmo tempo, tem o grupo que segue inerte. Eles me olham com orgulho, sorriso no rosto. Alguns chegam a cruzar os braços.


Em seguida, pergunto quem tem 60 anos ou mais. Em resposta, sobem as mesmas mãos da primeira pergunta, com o acréscimo das demais mãos. Todos se olham e riem. Os que se identificam como idosos, sorriem meio amarelo para os que não se identificam como idosos.


Que cenário rico para uma abordagem sobre envelhecimento, preconceito com a idade e, ainda, os reflexos disto nas relações familiares, sociais e (por que não) jurídicas!


A explicação inevitável, num cenário que se repete em toda palestra, é sobre a determinação legal a respeito dos cortes de idades para as definições dos sujeitos de cada direito: somos criança do nosso nascimento, até os 12 anos incompletos. Dos 12 anos completos até os 18 incompletos, somos adolescentes. Ao fazermos 18 anos, nos tornamos adultos, pessoas civilmente capazes. E esta denominação se modifica quando completamos 60 anos. Nesta idade, passamos a ser identificados como idosos, permanecendo a capacidade civil.


Quando eu pergunto "quem é idoso?", não estou perguntando quem tem dificuldade de locomoção, ou problemas auditivos, ou necessidade de auxílio de terceiros para qualquer atividade, ou se tem doença crônica diagnosticada. Quando pergunto quem é idoso, quero apenas saber quem tem 60 anos ou mais.


Acontece que o preconceito com o envelhecimento é tão culturalmente estabelecido que, mesmo não perguntando sobre a qualidade de vida e condição de saúde dos presentes, muitos entendem que é disto que estou falando!


Uma pesquisa da Fiocruz, de 2014, traz uma possível resposta pra esta dificuldade em aceitar uma terminologia biológica, que apresenta um corte na sociedade única e exclusivamente para incluir esta parcela da população em políticas públicas específicas.


Pois bem, nesta pesquisa, os entrevistados responderam o que entendiam ser o envelhecimento. As três respostas mais repetidas diziam respeito à (1) redução do envelhecimento a um processo orgânico que apresenta consigo as doenças e problemas de saúde; (2) ao surgimento de necessidades e a perda de capacidades produtiva, intelectual e de autocuidado e (3) à imposição de cuidados aos familiares, tornando a pessoa que envelhece um problema social e familiar.


Se nós envelhecemos pensando estas questões como verdade absoluta, é claro que vamos negar a nomenclatura "idoso", até que nos sintamos dentro de um destes três grupos citados na pesquisa.


Senão vejamos: um idoso que não apresenta problemas de saúde, não dependem de ninguém para suas atividades, desenvolve trabalhos remunerados ou voluntários e, ainda, não se sentem um problema para ninguém... como este idoso vai se entender idoso, se não se enxerga nos quadros pintados pela visão cultural que temos do envelhecimento?


A importância de desmistificarmos o envelhecimento, apresentando-o como um processo natural e que trará como resultado as consequências das escolhas de cada um, é fundamental para que a própria sociedade passe a enxergar a pessoa idosa como parte da sociedade, detentores de direitos e de deveres, como todos os demais, independente da idade.


Entender que envelhecer não é adoecer, nem caminhar para a dependência, é fundamental especialmente para aqueles que não chegaram aos 60 anos ainda. Compreender este caminho e as determinações legais, por cortes de idade biológica, é fundamental para que possamos nos sentir sujeitos dos direitos determinados para cada grupo existente (criança, adolescente, adulto e idoso).


E você? Já é uma pessoa idosa?

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