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As avós babás

Um assunto delicado, em especial para as famílias de baixa renda, que dependem da oferta de creche e escolas nas redes públicas e, muitas vezes, não são atendidas.



É bastante comum que os avós estejam envolvidos no cuidado dos netos. Esta é uma realidade brasileira, uma questão cultural inclusive. Um bom exemplo, é a quantidade de mulheres que, ao terem seus filhos, passam os primeiros dias ou semanas na casa da mãe ou com a mãe em sua casa.


Insegurança, necessidade de apoio, a questão do curto afastamento do trabalho do pai recém nascido (que é de 5 ou 20 dias apenas), enfim, são muitas as questões que fazem os primeiros dias de um bebê ser dividido com a avó. E isso é muito bom e auxilia na construção de uma relação de afeto entre avó e neto.


Porém, o que tenho visto aos montes, são avós assumindo o compromisso de cuidar dos netos diariamente, como babás. Tem dias, horários, tarefas e rotinas a cumprir com a criança. Se esta rotina não é em período integral, é contra turno (no período em que a criança não tem creche ou escola).


Sempre me pergunto se a avó e os pais daquela criança tem consciência do que significa essa transferência de cuidado. Muitas vezes a necessidade de ter alguém para cuidar da criança, somada a uma "disponibilidade" da avó aposentada, é a matemática inquestionável. Meio que "um caminho natural" a ser seguido, sem contestação por nenhum dos envolvidos.


Porém, essa função assumida acarreta num custo alto para toda a família. A partir do momento em que a avó vira a babá, ela deixa de ser avó. Avó tem uma relação com o neto de puro afeto, com carinho, sem muita cobranças, de contação de histórias, passeios e comidas mágicas. Avó é uma brincadeira que os pais não sabem, são segredos compartilhados.


Quando a avó passa a cuidar diariamente, ela assume a função de educar, de cobrar, de exigir, de impor. Vem a disputa por espaço, as conversas sérias, os puxões de orelha... a avó passa a ser a delatora para os pais.


Avó que é avó, não cansa, porque não tem a responsabilidade compartilhada com os pais. A avó babá é levada a exaustão! Falta-lhe tempo para a própria rotina, para o descanso, para cuidar da sua saúde. Falta o tempo de um passeio, de uma tarde com um grupo de amigos. Falta o tempo que era seu!

Muitos filhos me dizem: mas foi ela quem ofereceu ajuda! E eu sempre pergunto: mas quem aceitou? E a quanto tempo a ajuda está sendo "prestada", sem qualquer perspectiva de mudança?

POLÍTICAS PÚBLICAS

Ressalto, também, que as avós babás são o reflexo da falta de entendimento sobre a necessidade de integração das políticas públicas. Quando não há creche que aceite bebês com menos de dois anos na rede pública, este problema sobra para a família resolver. Comparando o custo de uma mãe sem trabalhar, cuidando do filho em casa e de uma avó aposentada cuidando do neto, é financeiramente mais vantajoso a mãe retornar ao mercado de trabalho, deixando o bebê com a avó.


Quando existe creche ou escola que atendam no território daquela família, o empecilho está no turno. Meio período é o que se consegue, é o determinado pela lei. Para conseguir uma matrícula em período integral, é preciso já estar trabalhando, com a devida comprovação. Ambos pais precisam comprovar vínculo de emprego em horário comercial. Caso contrário, a criança ficará meio período na escola e, depois... a avó cuida!


Além disso, o longo período de férias escolares - de dezembro até fevereiro - também ocasiona o fenômeno migratório dos netos para a casa dos avós. É outra conta que não fecha, pois os pais tem direito a 30 dias de férias. As crianças ficam quase 90 em casa. Se tudo der certo e os pais tirarem férias um seguido do outro, ainda restará mais 30 dias da criança para um terceiro cuidar. Contudo, nesta formatação, jamais haverá uma "férias em família". Compreendeu?


Política pública deveria olhar para esses entrelaçamentos. Onde falta e onde essa escassez vai se refletir. Infelizmente, esse olhar parece que vai demorar para acontecer. Até lá, a "Creche da Vovó" seguirá funcionando, retirando dessas idosas o direito de gozar a velhice como foi planejado ou como lhe convier.

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